Márito é homem mais popular da Quinta do Conde. Alto e franzino, traja umas calças de fazenda cinza escuro e um pullover da Lacosta, quer seja Verão, quer seja Inverno. No rosto curtido do sol, ostenta um fino e tímido bigode negro, que está a um dedo de pegar com as patilhas. Vive do Rendimento Social de Vinho (RSV), suportado pelos amigos compinchas do levantar copos de três. Ontem foi um dia especial, tal como os outros, simplesmente porque havia vinho. E Sábado é sempre o dia forte da luta de copos. Ontem os amigos de Márito estavam, felizmente, bem dispostos e ninguém olhou a dinheiro. Márito ia fazendo o gosto aos dedos, às mãos, à boca, à língua, a tudo (excepto ao fígado). Entre as três da tarde e as onze da noite, pegava uns copos nos outros, só interrompendo a prática com pequenos reparos ao que os amigos iam dizendo, bem mais modestos na bebida. A certo ponto, Márito ajudou (e muito) a esgotar o vinho na taberna, num consumo jamais esperado pelo dono da catedral do vinho da Quinta do Conde. Márito, que nem tinha ido a casa ver do jantar da sua Maria, não gostou do erro de cálculo e queria mais.
Por isso, pouco passava das onze da noite quando se conseguiu montar em cima da sua Famel e rumar a uma outra tasca, em Fernão Ferro. Conhecia a estrada como ninguém, mas hoje parecia que estava diferente, mais sinuosa e as curvas tinham mudado de sítio. Então, para pleno gozo dos camaradas que o viam arrancar aos "ss" pela estrada fora, Márito colou a roda da frente à linha branca da estrada e assim foi, sempre encostado à direita. Bom, nem sempre conseguiu ir em cima da linha, até porque o guiador da Famel parecia que tinha ganho vida própria. Umas vezes mais direito do que outras, lá foi. Ia a pouco mais do meio de caminho quando as linhas começam a desaparecer. Ora, era naquele sítio que mudava a freguesia, e acabavam as linhas de marcação da estrada. "Bonito serviço" pensou o vinho dentro do corpo de Márito. Mas lá continuou, a uns 30 km/h, até à curva seguinte. Saiu da estrada, enfiou a roda da frente da sua Famel num buraco, desequilibrou-se e caiu. Dois ou três arranhões no braço e o garfo da Famel torto. Márito adormeceu, já muito perto da meia-noite, na berma da estrada, deitado junto à mota. Os carros que por lá passavam ignoravam por completo o "podre de bêbado" e só de manhã Márito acordou. Levantou-se e caminhou, empurrando a sua motorizada. Chegou finalmente à tasca de Fernão Ferro e pediu: "Um pénalte fáxavor". Foi a casa ver do almoço e voltou para a Quinta do Conde, onde o stock já tinha sido reposto.
2 comentários:
eheheheheheh! o melhor dos caminhos, quando se está bêbado, é sempre o do meio, se bem que, a estratégia da linha até não está má. afinal, sempre se chama guia. eheheheheh muito bom, especialmente a descrição, logo de inicio, do Márito.
Claudinho, Claudinho... como vai a vida em Lx?!?!?!?!
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