quinta-feira, 18 de agosto de 2005

Zé João: A carta velha que ajudou Manela - parte VI

Dois dias depois, Zé João recebe a visita do cunhado, soldado na GNR de Celorico de Basto. Com muita vergonha à mistura, Zé João decidiu contar ao cunhado Arménio o que se tinha passado. Sempre com os olhos postos no horizonte e sem nunca olhar o guarda nos olhos. O desabafo era visto como a última oportunidade para uma libertação que tardava a chegar. Arménio ouviu as amarguras do cunhado, que já não via há quase seis anos. Decidiu vir a Sassoeiros em passagem para o Algarve, onde vai passar uma semana de férias com a mulher, irmã de Francisca. Depois de ouvir a história até ao fim, fechados no escritório para que a vergonha não seguisse para outros ouvidos, Arménio aconselhou o cunhado, despindo a sua “farda” de GNR. Um sorriso voltou ao rosto de Zé João quando a solução estava mais perto do que esperava. Bastava voltar a usar a sua antiga carta, de papel, de um cor-de-rosa em forma de lençol. Aí nenhuma contra-ordenação fica gravada e Zé João tinha a oportunidade de esquecer a existência daquela tramado cartão magnético. De acordo com o soldado Arménio, a informação não está ainda suficientemente cruzada com os serviços centrais e as contra-ordenações são apenas gravadas na banda magnética. Acontece que, se por acaso, o “documento” se perder, perdem-se também os atropelos à lei. E assim fez Zé João. Combinou com o cunhado guardar esse segredo. Partiram e queimaram a carta, com Zé João a assistir a tudo com o nó na garganta, afinal não estava a agir de forma correcta para com o Estado. Ao jantar, Zé João já nem parecia o mesmo e sorriu três vezes. Estava aliviado e o ambiente em casa estava bastante mais tranquilo. O cunhado Arménio, mais a mulher Francisca e a filha Mariana seguiram viagem para Armação de Pêra. Mas a história que no cunhado Arménio lhe contou ficou a maturar na cabeça, coberta de cabelos brancos. E lembrou-se, agora que estava safo, que podia ser útil, pela primeira vez, a Manuela Moura Guedes. Decidiu então escrever uma carta, com o seu próprio punho, a contar toda a história, mas, obviamente, ocultando o seu caso pessoal. No dia a seguir, logo pela manhã, foi aos Correios comprar um selo de Correio Azul e enviou a denúncia, directamente para Manuela Moura Guedes. Dois dias depois, um telefonema da TVI. Ficou trémulo. Era uma jornalista que estava a falar da parte da Manuela e que queria saber mais pormenores. Acabou por contar tudo o que sabia, sem nunca referir que passou a utilizar a sua carta cor-de-rosa, mesmo depois de ter pedido uma “carta do futuro”. Teve apenas que esperar mais três dias até que a bomba rebentasse e abrisse o Jornal Nacional, ainda com Manuela de férias. Em resposta à notícia, o ministro da Administração Interna assegurou que, dentro de um mês, as informações das bandas magnéticas passariam a ser descarregadas nos serviços centrais, para não haver fuga às contra-ordenações. Mais um vez aliviado, Zé João estava safo.

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