sexta-feira, 12 de agosto de 2005

A imagem de Zé João pelas ruas da amargura - parte V

A multa estava paga, mas a imagem de Zé João rastejava pela lama. Ainda pora mais, na Direcção-Geral de Viação, onde foi pagar a multa, disseram-lhe que a contra-ordenação ficaria gravada na banda magnética da sua carta de condução. A maldita modernice daquela fita preta no verso da carta nova que foi tirar depois de ouvir a Manuela a dizer maravilhas do novo cartão no Jornal Nacional. Chegou mesmo a irritar-se e a dobrar o recibo da multa com toda a força, que quase quase se rasgou. Passada a irritação ficou a vergonha. Com que cara vai agora olhar para os polícias ou os guardas que o mandarem parar? Mesmo que eles não coloquem a sua carta de condução no leitor, Zé João sabe que está lá o seu excesso, do qual jamais se perdoará. Ele sabe que está lá, mesmo que mais ninguém o saiba. E isso é o suficiente para Zé João sentir que a sua honra está manchada. Por isso, há uma semana que não sai com o carro, estacionado à porta da sua vivenda. Nem sequer tem tido paciência para lavar o seu 206. Os amigos já estranham as ausências de Zé João no café, ao final da tarde. E, por estes dias, nem a televisão tem ligado, porque a Manuela está de férias, sem data certa de regresso. Até lá, Zé João vive com a sua honra numa depressão profunda, apesar de jamais admitir que precisa de ajuda. Dava tudo para poder apagar aquela contra-ordenação do maldito cartão magnético.

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